sexta-feira, 5 de março de 2010

Entre os Muros da Escola

(Entre les Murs, de Laurent Cantet)



Acho que hoje, pela primeira vez, eu entendi toda a sensação em rever filmes, o que é completamente diferente de ver de novo. Rever implica não só em assistir novamente, mas também em repensar, absorver coisas novas e, quem sabe, até sentir algo diferente. Rever "Entre os Muros da Escola" foi uma experiência muito diferente de simplesmente assistir aquela minha comédia romântica favorita pela décima. Foi como olhar pra dentro e rever eu mesma.
"Entre les Murs" foi um dos poucos filmes que eu vi ano passado. E, engraçado, lembro de tê-lo assistido também em março, no início das aulas. Hoje, por coincidência (ou não), eu passava os canais até chegar no VH1 quando vi que ele tinha recém começado no Telecine. A ideia era assistir só um pedacinho, afinal de contas, eu já havia visto aquele filme, o tempo é curto e eu tenho zilhões de coisas pra ler, ver, escrever, pirar. Só que aí eu comecei a assistir, lembrar de algumas cenas e - aí o lance mais incrível - me dar conta de detalhes e de conceitos centrais que eu não tinha nem reparado um ano atrás. 
Resumindo bastante, o filme é uma espécie de documentário-ficcional (oi?) sobre as aulas de Francês em um colégio da França. Acompanhamos as aulas, os diálogos e os conflitos de uma turma e do professor (François Marin) em questão. O filme é, assim, genial. Isso eu já tinha achado da outra vez. Dessa, mantenho minha opinião e ratifico: ele é muito genial.
Como eu disse, percebi aspectos que antes tinham sido simplesmente ignorados.
Os personagens são incrivelmente bem construídos. Todos eles. O professor, digamos assim "o protagonista", é tão humano que em alguns momentos chega a dar raiva. Poderiam ter caído no clichê de desenhar o "professor" perfeito e, confesso, durante alguns momentos do filme eu achei que François o fosse. A aula dele é, talvez, aquela que muitos (lê-se: Lucy) na oitava série tenham desejado ter: ele transcende os aspectos da matéria e dialoga com os alunos, filosofa, contesta. A aula é dinâmica, discute-se, participa-se. Isso tudo, claro, guardadas as proporções em uma turma de seus vinte e tantos estudantes adolescentes e toda a bagunça inerente a uma aula menos ortodoxa. Ele é o professor que, na reunião, não concorda em punir os alunos, que procura outros métodos de ensino. Que propõem trabalhos diferentes, como a confecção de um "auto-retrato". Acontece que, quando se vê o filme pela segunda vez, percebe-se que ele também é o cara que não consegue controlar a turma; que grita quando inicia um diálogo mais difícil com algum aluno; que abandona, que perde a esperança; que, em momentos mais difíceis, não consegue controlar a si mesmo. François é um personagem real, com as qualidades e os defeitos, e estão todos eles ali, na tela, completamente explícitos, assim como os outros personagens. Temos a garota mais "rebelde", a que desrespeita, a mal-educada, aquela que dá a impressão de ignorar tudo e todos durante o filme, mas que, de repente, revela-se alguém que se importa - embora não com as coisas de "dentro dos muros". Tem o garoto problemático, aquele que não controla a própria raiva, que briga, que senta no fundo e passa a maior parte do tempo na diretoria, mas que, contudo, é também o garoto que faz o melhor trabalho - e o mais criativo - quando lhe dão uma oportunidade diferente. E tem a aluna que "muda", que discute com o professor e a barreira erguida entre os dois - e o modo como esse muro vai sendo desmanchado ao decorrer do ano letivo. Esses não são os únicos personagens, mas eu vou parar por aqui.

O filme que eu assisti em março de 2009, aquele "Entre les Murs" deveria ser exatamente o mesmo de agora. Mas, por sorte, não é. Filosofias a parte, a Lucy mudou um pouquinho nesse um ano. E eu acredito, sinceramente, que todos os meus erros, defeitos, tropeços, todas minhas idiotices, reflexões, conversas, que todo o meu amor, tenham me mudado pra melhor. Acredito, enfim, que esse um ano de espaço - e tudo o que aconteceu nele -  tenham me feito perceber mais nitidamente esse filme, que é o retrato de um relacionamento tão singular (entre aquele professor e aqueles alunos) e tão distante fisicamente, mas ao mesmo tempo tão próximo em sensação.
Acho que é isso que significa, pelo menos pra mim, rever um filme. É, ao assisti-lo pela segunda vez, se dar conta de que o filme mudou porque o dono cujos olhos miram a tela já não é mais o mesmo.

Um comentário:

Rodrigo Oliva Peroni disse...

Adorei a tua mudança e as tuas metáforas com muros!